"(...) a cultura pode fazer você atentar melhor para o que diz, evitando diversos mal-entendidos verbais que geram tanto desperdício de energia no cotidiano de todos. Não soa útil? A cultura pode fazer de você melhor aluno ou professor, não só por complementar a formação curricular (cultura é sempre crédito opcional nas escolas e faculdades), mas sobretudo por ajudar a contestar tal formação e, no processo, até mesmo assimilá-la com menos dificuldade. Há exemplos à mancheia. Dizem ainda que a cultura serve para reforçar a identidade, mas é justamente o contrário: ela serve para perceber nuances entre as identidades, justamente com o objetivo de esgarçar limitações e não cair na rede de ironias históricas. Cultura não é apenas encontro com o país, é também desencontro, desterro, disjunção.
E há a questão existencial, digamos assim. Se nos resta o que Rimbaud resumiu, "preservar o vigor combativo e aclamar a beleza", dado o número de incertezas, frustrações e azares que qualquer pessoa sofre, o que é melhor do que a cultura para nos ensinar isso? Pois cultura é útil num sentido mais indireto, que é o de intensificar a percepção, aguçar a inteligência, ampliar a sua capacidade de associar e antecipar, fazendo de você melhor ser humano, melhor profissional, não mais "feliz" ou "bem-sucedido" - e sim, ao mesmo tempo menos orgulhoso e mais seguro, menos complacente e mais compreensivo, menos crédulo e mais produtivo, menos passivo e mais alerta.
O problema é que a escala de valores vigente - a cultura - induz uma esperança em moto-perpétuo, um otimismo auto-viciador, uma ilusão de satisfação plena, com os outros e objetos, movida a dicotomias baratas, para a qual a própria cultura é antídoto. O resto é cereja."
Falou e disse, Piza, em 08/99
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sexta-feira, fevereiro 09, 2007
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